Brumadinho – Córrego sem Feijão

A chef Carmelita Chaves assina a coluna "Fala, Carmelita", onde através de crônicas, nos apresenta histórias e curiosidades sobre a vida em Brumadinho e região.

Fev 7, 2025 - 15:16
Fev 7, 2025 - 15:18
Brumadinho – Córrego sem Feijão

 “A morte não nos preocupa, porque enquanto existimos, ela não existe, e quando ela existe, nós não existimos mais.”
Sêneca

Sentada em um banco moderno, cercado por canteiros de flores, parecia que estava em um país desenvolvido. A arquitetura e as construções eram perfeitas, tudo muito bem planejado. 

O restaurante, a lanchonete, as lojas de artesanato, a biblioteca… enfim, cada espaço equipado com todos os aparatos necessários para seu bom funcionamento. Havia até um mirante com escadas circulares. Tudo lindo, limpo - só não tinha gente. 

No exílio das minhas memórias, não queria recriar as lembranças do que havia acontecido naquele lugar. Seria difícil, hoje, reproduzir a intensidade dos meus sentimentos quando o desastre ocorreu. Dói, sim. Não dá para fingir que nada aconteceu! 

Cadê o povo desse córrego? Desapareceu, assim como o feijão que, nas memórias mais antigas dos “corguenses”, era cultivado à beira do riacho. Profundamente abalada, com muito esforço, voltei do meu pesadelo e caminhei até outra obra da “reparação”, recém-inaugurada.

O memorial tinha um valor imaterial, pois me lembrava algo inexpugnável: não podíamos brincar, violentar a natureza. 

Ela grita, chora, e as consequências de suas lágrimas levam os vivos por uma correnteza sem medir os estragos. Aquilo me parecia uma situação desesperadora, sem qualquer desfecho imaginável.  

Tudo ficou em brumas. A visão turvou, e cambaleei ao perceber que estava em um lugar que lembrava a morte - e a morte estava viva ali, através de uma obra cheia de simbolismo triste, mas maravilhosa. O objetivo da arte foi alcançado.  

Para todos aqueles que, como eu, vivenciaram tão de perto e para aqueles que acompanharam de longe, de todas as partes do mundo, esse momento tão marcante da nossa história, não deixem de visitar o Memorial às Vítimas de Brumadinho. 

Ele mostrará à humanidade o que o descaso com a exploração minerária pode causar a todos os habitantes deste planeta.

* Carmelita Chaves é publicitária, escritora e restaurateur 

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